Cultura e Lazer

Sofi Oksanen fala sobre guerra e sobrevivência em Quando as pombas desapareceram

Novo romance da autora do celebrado ?Expurgo? também se passa na Estônia e explora o impressionante contexto histórico do país

QUANDO AS POMBAS DESAPARECERAM

(Kun kyyhkyset katosivat)

 

SOFI OKSANEN

Páginas: 350

Preço: R$ 54,90

Tradução: Pasi Loman e Lilia Loman

Editora: Record

O que à primeira vista parece uma mistura caótica de datas, nomes e eventos, acaba se consolidando em um romance cheio de camadas, onde tudo e todos são carregados de importância. É tudo muito rico, e por vezes pesado - tenso, denso e intenso. Sofi Oksanen é uma romancista de respeito.
The Independent

 

A Estônia e seu impressionante histórico de conflitos e mudanças é mais uma vez o cenário ? e também personagem ? do novo romance da finlandesa Sofi Oksanen. Ela já havia ambientado Expurgo, seu mais famoso e celebrado livro, no país báltico. Agora, em Quando as pombas desapareceram, que chega às livrarias em setembro pela Record, ela investiga as trajetórias de três personagens e suas estratégias de sobrevivência em meio à guerra.

A trama se passa nos anos 1940 e 1960, dois momentos distintos que Oksanen alterna na narrativa, criando suspense e tensão, enquanto, ao mesmo tempo, constrói habilmente os protagonistas de seu drama familiar. Neste período, a Estônia passou por muita instabilidade: foi invadida pelo exército russo em 1940, ocupada pelos alemães nazistas durante a Segunda Guerra, e, após a derrota de Hitler, devolvida ao domínio soviético, do qual só se tornou independente nos anos 1990. O relato de uma existência em meio a tanta incerteza é um dos pontos fortes do romance.

No começo da história acompanhamos Roland e seu primo, Edgar, lutando contra o exército vermelho em 1941. Enquanto o primeiro é idealista e aferrado a seus princípios, o segundo é mais relutante e disposto a comprometer suas convicções. Com a chegada dos alemães, cada um enfrentará o novo regime a seu modo: enquanto Roland foge, Edgar assume nova identidade como defensor do nazismo, abandonando a mulher, Juudit. Esta, que já tinha dúvidas em relação ao casamento, se vê dividida entre os dois lados do combate, já que não confia nos alemães, mas acaba se apaixonando por um agente da SS.

Anos mais tarde, com a Estônia já de volta ao conglomerado comunista, os três continuam tendo suas vidas ligadas e precisam lidar com tudo o que fizeram para conseguir sobreviver. Em meio a atos de heroísmo, traição e paixão com direito a um mistério que só é resolvido no fim , Sofi Oksanen escreve sobre a fragilidade da humanidade ao ser submetida a regimes tirânicos.

TRECHO:

Juudit não queria se encontrar com essas mulheres, que falariam do retorno dos maridos ou de como noivos, pais e irmãos já haviam saído da floresta ou escaparam para casa na Estônia, ou do Exército Vermelho no golfo da Finlândia. Ela não tinha nada para lhes dizer; não enviara uma única carta ao marido. Havia tentado, certamente: pegara papel e tinta, se sentara à mesa, mas sua mão não conseguira formar palavras. Escrever até mesmo a primeira letra do nome do marido era difícil demais; pensar em uma primeira frase, impossível; ela era incapaz de escrever uma carta como uma mulher que sentia falta do marido, e somente esse tipo de carta podia ser enviado para a frente de batalha. Todas as noites em que tinha tentado sem sucesso e as noites em que nem mesmo tentara voltaram à sua mente. Tampouco havia se esquecido de todas as vezes que tentara usar uma blusa decotada, mas mesmo assim fracassara em chamar a atenção do marido. Lembrava-se com clareza do desconforto que se seguia, lembrava-se de como todas as suas ideias sobre o que tinha de atraente se mostraram equivocadas; lembrava-se de como o marido recém-casado havia afastado os seios que ela oferecera, empurrara-os para o outro lado da cama como quem empurra comida estragada para o outro lado da mesa.

 

Sofi Oksanen nasceu em 1977 na cidade de Jyväskylä, na Finlândia. Seu romance de estreia, As vacas de Stalin, a colocou no mapa dos grandes escritores europeus. Depois, com Expurgo, ela se transformou num fenômeno, tendo sido traduzida para mais de 30 países. Foi o primeiro livro a ganhar os dois prêmios mais prestigiados de seu país: Prêmio Finlândia (2008) e Prêmio Runeberg (2009).